O povo, ou seja a população, vem sendo bombardeada com pequenas restrições, até genuínas, corretas e necessárias. Ocorre que ao primeiro momento, essas restrições não acarretam grandes mudanças na vida particular do indivíduo, mas aos poucos, vão moldando-o até que sem perceber, aceitam e incorporam ao seu dia-a-dia e lá no final, estará nas mãos dos poderosos, dos donos do mundo.
Essas mudanças no indivíduo, fazem com que cada um pensem e imaginam como se fosse uma normalidade e para o seu bem estar. É claro que para implantar grandes mudanças, primeiro começa-se com as necessidades primárias, ai então tudo que quiserem, desse de goela abaixo. O controle da da sua vida e da população está ai, a olhos vistos.
Matéria Transcrita do Jornal O POVOonline do dia 12/09/09 Tiago Coutinho
Em nome do bem-estar coletivo, hábitos corriqueiros para muita gente passaram a sofrer restrições. Normas para estabelecer um padrão de civilidade mínimo a atos individuais que, sem regras, podem trazer prejuízos coletivos? Ou intromissão indevida no poder público na vida particular?
Ela sai da loja onde vende joias, na avenida Dom Luís, e se dirige para o barzinho ao lado. Acende seu cigarro e fica a observar, enquanto dá um descanso no trabalho. Toma um susto quando o repórter lhe informa que a lei antifumo foi aprovada e já está valendo no Ceará. “Não era apenas em São Paulo?“.A diferença da lei estadual antifumo - de autoria do deputado estadual Dedé Teixeira (PT) e em vigor desde o dia 2 de Setembro - para sua versão paulista é que, no Ceará, os estabelecimentos podem criar locais reservados para fumantes, enquanto, em São Paulo, os chamados fumódromos estão proibidos. Nos dois casos, porém, é proibido fumar em recintos coletivos, públicos ou privados.
O bar onde a vendedora de jóia fuma seu cigarro é aberto. A lei, portanto, não altera em nada sua atitude corriqueira. Mas tramita na Câmara Municipal de Fortaleza um projeto de lei, de autoria do vereador Marcelo Mendes (PTC), que estabelece normas ainda mais rígidas para o controle do fumo, exatamente igual à adotada em São Paulo. Caso a proposta seja aprovada, a vendedora, que prefere não se identificar, precisará ficar sozinha na calçada, para satisfazer o seu vício.
“Cada um sabe o que está fazendo. Pior do que fumar, é beber. Os bêbados perdem o controle, agridem as mulheres. Se fosse para parar de fumar, eu não teria começado. Deveriam medir também a quantidade máxima de bebidas vendidas para uma pessoa“, sugere.
A sugestão da vendedora não foi 100% acatada - até agora, pelo menos. Mas a liberdade para consumir álcool também está na mira do poder público. Desde Abril, foi publicada no Diário Oficial do Município a lei municipal 9.477, que restringe o funcionamento de bares depois da meia-noite, de domingo a quarta-feira. De quinta a sábado e em véspera de feriado, a lei autoriza uma hora a mais de funcionamento. O texto legal prevê uma campanha, de 90 dias, anterior a qualquer punição. A campanha, assim como a lei, nunca saiu do papel.
Leis, leis e leis
Lei antifumo, lei dos bares, lei seca, lei do silêncio, toque de recolher. Nos últimos dois anos, em todo o Brasil, uma série de leis restritivas vem mobilizando calorosas discussões sobre comportamentos comuns, criticados, mas, até há pouco tempo, raramente punidos. O Estado tem como função buscar o bem-estar comum. Por isso, adota ações restritivas, como medida de saúde, segurança pública e civilidade. Mas, até que ponto a coletividade pode suprimir um direito individual de um adolescente poder se divertir na rua durante a madrugada? Ou obrigar um boêmio a voltar para casa mais cedo, por ausência de bares abertos? Ou, ainda, um culto religioso a controlar o volume de suas orações?
A questão é complexa e envolve vários setores e pontos de vista. Uma vez ameaçado um costume até há pouco tempo aceito socialmente, as reações são as mais adversas. De acordo com Jânio Cunho, professor de Direito Constitucional da Universidade de Fortaleza (Unifor), não há direitos fundamentais absolutos. O Estado, em benefício da coletividade, pode fazer restrição a qualquer direito, até mesmo o direito à vida, como ocorre em alguns casos de aborto. O professor acredita que o desafio é, justamente, buscar o equilíbrio entre medidas coletivas, sem eliminar o direito individual.
E quais seriam esses limites? “Ninguém tem como responder de forma objetiva. Por sermos uma democracia representativa, ela deve passar pelo Congresso e as assembleias. Porque nem sempre pode consultar o povo constantemente“, argumenta.
Para o professor do programa de pós-graduação em Serviço Social da Universidade Federal do Pará (UFPA), Carlos Maciel, leis desse cunho fazem parte de um processo civilizatório, que seria a constituição de valores morais como parâmetros para a população. “O Estado pode ser responsável para a afirmação de novos valores“. Porém, a constituição de novas condutas, para ele, não passa apenas pelo aspecto normativo.
O Estado, para Maciel, precisa combinar duas ações: a pedagógica de ensinar novos comportamentos e a criação de mecanismos inibidores eficientes. “Se ele não consegue fazer isso de forma efetiva, pode fazer a repressão pela repressão. O que, em vez provocar mudanças, pode causar aversão“. O efeito, avalia, acaba sendo contrário ao pretendido. Nas próximas páginas, O POVO discute as leis criadas recentemente e seu papel na efetivação de um bem-estar social e coletivo.
O POVOonline
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