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sábado, 28 de fevereiro de 2009

Suiça - Advogado de Paula O. diz que confissão de farsa não é válida

Para o advogado Roger Müller, indicado pelo Procuradoria Geral de Zurique para defender a brasileira Paula O., a confissão feita à polícia não tem validade. Ele também acha pouco provável que ela tenha simulado o ataque para obter indenizações por danos morais.

A estação de trem de Stettbach, onde Paula O. afirmou inicialmente ter sido atacada por skinheads.
Legenda da foto: A estação de trem de Stettbach, onde Paula O. afirmou inicialmente ter sido atacada por skinheads. (Keystone)



Autoridades diplomáticas brasileiras confirmam a presença da consulesa durante o interrogatório de 13 de fevereiro. Ministério Público cogita três saídas possíveis.

A reportagem publicada na semana passada pelo semanário "Weltwoche" elucidou parte dos mistérios relacionados ao caso da advogada brasileira Paula O., como admitiu há poucos dias a Procuradoria Geral de Zurique. Porém a história é mais complexa do que parece.

Como confirmam representantes do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, a cônsul-geral Victoria Cleaver esteve presente no interrogatório da manhã de 13 de fevereiro, onde Paula O. teria assinado uma confissão. "Ela esteve não apenas presente nesse dia, como em todos os outros nos quais havia sido convidada pela família da brasileira para prestar-lhes assistência", confirma conselheira Marisa Baranski.

O Consulado do Brasil em Zurique limita-se agora ao trabalho de acompanhamento. "Trata-se de um caso policial. Só iremos observar para que nenhuma injustiça seja cometida", afirma a diplomata.

Roger Müller é o advogado escolhido pela Procuradoria Geral de Zurique para defender Paula O. Fluente em português, ele é especializado em questões ligadas aos dois países e já está em contato próximo com a brasileira. Sem entrar em detalhes ao falar da estratégia de defesa, Müller explicou à swissinfo, por telefone, nesta quarta-feira (25), que considera inválida a confissão feita por Paula O. Justificativa: um advogado não estava presente no momento. Na entrevista, ele explica porque considera pouco provável a hipótese levantada pela "Weltwoche" de interesses pecuniários por trás dos atos da brasileira (ouça os áudios na coluna à direita).

Swissinfo: Como o Sr. foi escolhido para defender Paula O. nesse caso?

Roger Müller: Existe um departamento do Tribunal do Distrito de Zurique que se chama "Escritório para mandatos públicos". Ele é que escolhe normalmente um advogado em casos onde o nosso Código de Processo Penal prevê que um acusado ou, em certos casos até uma vítima, tem de ser representado por um advogado. Esse departamento é chefiado pelo vice-presidente do tribunal, o Dr. Max Hauri, que me ligou para dizer que precisava de um advogado que falasse português e conhecesse a cultura brasileira, para poder se comunicar com a cliente, os familiares e também com o Consulado do Brasil. Ele perguntou se eu queria assumir a causa.

E o Sr. aceitou?

Sim. Eles me contrataram, pois conhecem o meu perfil. Eles sabem que eu tenho um escritório de advocacia especializada em assuntos suíços e brasileiros.

Paula O. e sua família aceitaram que Sr. os representassem?

Sim. Estamos tendo um bom relacionamento.

Qual é o atual estado de saúde de Paula O.?

Ela ainda está emocionalmente muito abalada, mas seu estado de saúde melhorou.

Ela já soube da repercussão do caso?

Ela não está a par de todas as notícias, mas de uma parte sim.

Paula O. já foi interrogada?

Pela polícia sim, mas não pela Procuradoria Geral de Zurique.

A revista semanal "Weltwoche" publicou há poucos dias informações sobre sua confissão. Ela já teria sido feita?

O que foi dito ocorreu durante um depoimento prestado diante da polícia e não do promotor do Ministério Público. E como o advogado estava ausente, ele não tem valor de prova.

Isso significa que a confissão não poderia ser utilizada no processo?

Não. Daqui para frente só pode ser utilizado no processo o que será dito ao promotor do Ministério Público. Se ela confessou ou não, isso ainda não tem nenhum significado para o que está para acontecer.

Mas a reportagem do "Weltwoche" indicou que ela até chegou a assinar protocolos da confissão na presença dos agentes de polícia. Esses documentos não poderiam ser utilizados no processo?

Se ela não confirmar na presença do Ministério Público, também não.

Então ela pode posteriormente negar tudo que disse aos policiais frente ao promotor?

Correto!

E o que o Sr. indicou a ela para fazer? Negar?

É claro que eu não posso responder a essa pergunta sobre o conteúdo da nossa defesa por sigilo profissional.

Pessoalmente ela fez uma confissão sobre seus atos ou admitiu algum erro?

Também não posso aprofundar-me sobre esse tema, pois não quero antecipar o interrogatório com o Ministério Público.

Como será a estratégia de defesa de Paula O.?

Estamos avaliando as três opções que temos, mas não quero antecipar nada, pois não houve um interrogatório no Ministério Público. Para nós ainda é muito cedo. Para a imprensa parece que o caso está quase terminado, mas não é nada disso. Ainda estamos muito no principio das investigações.

Uma das opções é o lúpus, a doença que seria sofrida pela advogada brasileira, não?

Como eu disse, essa é uma das opções. Mas eu tenho de me aprofundar nela, pois sou um jurista e não médico.

Já existe uma data marcada para o interrogatório do promotor Marcel Frei?

Deve ocorrer nos próximos dias, possivelmente ainda nessa semana.

Ela está em condições de saúde de prestar todas as informações em um interrogatório?

Sim. Ela está emocionalmente abalada, mas as condições de saúde dela são tais que poderia passar por um interrogatório.

Caso seja condenada por falso testemunho, Paula O. ficaria sujeita a que tipo de pena?

O Código Penal prevê uma pena privativa de liberdade de até três anos (reclusão) ou uma pena pecuniária (multa). Mas na prática e nesse caso, na pior das hipóteses que ela seja condenada - apesar de ainda não estar nada certo - creio que receberia somente uma pena pecuniária e ainda condicional, por ela não ter antecedentes criminais, vinculada a um tempo probatório de dois anos. Isso seria realista se a investigação levar de fato à condenação de Paula O.

Como advogado o Sr. tem orientado Paula O. e a família a como se comportar futuramente, inclusive no contato com a imprensa?

Trabalhamos juntos e combinamos coordenar nossos passos frente ao público. Acho que faz sentido a família trabalhar junto com a pessoa que está defendendo a sua filha.

Qual o papel do namorado de Paula O, o suíço Marco T. no caso? Sua ausência desde que a imprensa começou a cobrir a história é objeto de muitas conjecturas?

Ainda não sei.

O Sr. já teve contato com ele?

Apenas uma vez.

Ele está envolvido diretamente no caso?

Até o momento não.

A matéria da "Weltwoche" afirma que a polícia vê como muito provável que Paula O. tenha cometido esses atos somente para ser indenizada através da Lei de vítimas. Os valores pagos seriam algo entre 50 e 100 mil francos. Qual o fundamento dessa afirmação?

R.M.: Isso não é uma afirmação que o "Weltwoche" tirou de alguma fonte, mas pura especulação. Eu posso claramente rejeitá-la. Em primeiro lugar, na Suíça nunca é possível receber uma indenização moral desse montante como a "Weltwoche" publicou. Talvez na teoria, mas na prática nunca foram pagas indenizações morais desse nível. Isso é simplesmente errado. Em segundo lugar, ele não levou em consideração que a Paula vem de uma família bem situada no Brasil, de renome e patrimônio. Ela própria tinha uma vida boa na Suíça. Ela não precisa desse dinheiro!

Existe de fato essa Lei de vítimas na Suíça? Alguém poderia receber indenizações morais desse valor?

Na teoria sim, mas na prática não.

Com toda a repercussão que teve na mídia e até no relacionamento entre a Suíça e o Brasil, como o Sr. vê o caso Paula O.?

O problema foi muito mais uma falha na comunicação entre os jornalistas e as pessoas envolvidas, como a família ou o consulado brasileiro. Nunca houve muita informação por parte do Ministério Público e assim os jornalistas tenderam a fazer afirmações ou interpretações muito ousadas, que permitiram pensar que o caso era mais importante do que o era. Eu penso que o caso não foi tão grave como transpareceu para o público. Se uma pessoa é atacada por três desconhecidos ou induz uma autoridade a um erro, isso é de relevância menor.

O advogado Roger Müller.
O advogado Roger Müller. (www.rms-law.ch)

As queixas de familiares de Paula O. e de diplomatas brasileiros de falta informação por parte das autoridades é fundada? A Polícia de Zurique levou três dias para fazer uma coletiva de imprensa e informar o público.

A polícia não têm obrigação nenhuma de informar. Existem os interesses da vítima a serem protegidos. Existe também uma investigação que precisa ser mantida sob sigilo. Eu creio que nada ocorreu de errado. O público parece pensar que o caso está para terminar, mas ainda estamos no princípio dessa investigação. Nessa fase é claro que nenhuma autoridade envolvida pode dar amplas informações, muito menos a polícia que está sendo chefiada pelo Ministério Público. Se cabe a alguém informar o publico, esse é o promotor ou a chefia do Ministério Público, mas com certeza não a polícia.

O passaporte de Paula O. está bloqueado. Quanto tempo essa medida fica em vigor?

Essa medida cautelar só pode ser aplicada enquanto o exige a situação. Do momento que o promotor do Ministério Público colher informações suficientes para saber como ocorreu verdadeiramente a história, ele deve cancelar essa medida. Isso pode ocorrer em breve.

Três possibilidades para o fim do caso

Questionado pela swissinfo, Rainer Angst, porta-voz da Procuradoria Geral de Zurique, confirmou as afirmações do advogado de defesa de Paula O. na questão da confissão. "Ela pode teoricamente negar as informações que deu durante o interrogatório policial, pois não havia a presença de um advogado", admite, mas lembra que existe o perigo também de contradições.

Sem dar informações sobre uma possível data para o primeiro interrogatório com o procurador Marcel Frei, o porta-voz explicou que vê três saídas prováveis para o caso da brasileira. "A primeira seria a formalização da queixa contra Paula O. e então teremos um julgamento. A outra seria o arquivamento do processo em caso de falta de provas ou outras questões e, finalmente, pronunciar uma pena pecuniária (multa)".

Swissinfo


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