Ulisses Capozzoli
Quase sempre, de forma indefinida, nos mantemos à espera do futuro. Mas, com freqüência maior que estamos dispostos a acreditar, o futuro já chegou.
Não nos damos conta de um fluxo, a “seta do tempo” que, ao menos de um ponto de vista psicológico, escava uma fenda contínua e nos mantém aparentemente separados do passado e do futuro.
O futuro à frente, como se fosse a proa de um barco imenso, e o passado atrás, como a popa da embarcação do tempo.
Nos mantemos à meia-nau, para utilizar uma expressão clássica das navegações portuguesas, e esse parece ser o presente.
A meia-nau, normalmente a posição dos aposentos do capitão, tem a vantagem de ser o ponto mais confortável.
Ao menos quando o barco “caturra”, ou seja, navega contra o vento, e soca incessantemente o mar com golpes violentos de proa.
Se o vento é de “través”, ou seja, lateral, pouca diferença faz abrigar-se à meia-nau, na proa ou na popa.
A tempestade não poupa ninguém
Nas navegações do futuro, que já integram o presente, daí as percepções difusas que temos no oceano do tempo, o vento é mais complexo e perigoso.
O vento solar, uma chuva de partículas letal a uma tripulação espacial, deve ser previsível com a maior antecedência e acuidade possível. Com isso, a tripulação pode recolher-se em abrigos bem protegidos e esperar a tormenta passar.
Os observatórios Stereo, da Nasa, lançado em 2006, conseguiram, nesta semana, fazer a primeira observação mais precisa estrutura tridimensional de uma explosão solar.
Um sistema binário, o Stereo, como um par de olhos humanos (em vez de um único que equiparia os Ciclopes, figuras mitológicas a que Homero se refere na Odisséia) é capaz de fazer paralaxe e, assim, criar a noção de tridimensionalidade.
As imagens com precisão inéditas obtidas pelo sistema Stereo devem permitir, com maior facilidade, a previsão de futuras tempestades solares. Essa é uma conquista vital tanto a astronautas/cosmonautas do presente (a bordo da estação espacial, ou nos ônibus espaciais americanos e as naves russas Soyuz) quanto do futuro.
Explosões solares, seguidas de poderosas lufadas de vento, resultam do mecanismo nuclear no coração tanto do Sol quanto de outras estrelas (vento estelar).
O Sol, em particular, é uma gigantesca bomba de hidrogênio (“queima” 600 mil toneladas desse gás a cada segundo para produzir hélio e eliminar o excesso de massa sob a forma de energia) atuando há 5 bilhões de anos.
Do reator de fusão do coração solar, onde a temperatura atinge 15 milhões de graus Celsius, a energia ascende numa viagem lenta até a superfície solar e daí flui para todo o Sistema Solar até interagir com os domínios de estrelas vizinhas (heliosfera).
Mas a ascenção da energia está sujeita a contrações produzidas pelo poderoso campo magnético do Sol.
Eventualmente, linhas magnéticas retêm esse fluxo de energia e, então, no ponto em que a linha emerge, na superfície solar, forma-se um ponto escuro onde as temperaturas são menores que nas áreas circunvizinhas.
Mas, quando essas linhas se “rompem”, o fluxo interrompido de energia é rapidamente restabelecido e o que ocorre são explosões imensas, com o que os físicos solares chamam de ejeção da massa coronal.
Pontes chamejantes de plasma, a matéria solar, alcançam altitudes de até 500 mil quilômetros (mais que a distância média entre a Terra e a Lua) e então despencam espetacularmente de volta à superfície do Sol.
O Sol tem um período médio de 11 anos, entre um máximo e um mínimo, nas explosões e esse processo afeta intimamente o ambiente terrestre.
Explosões mais intensas não só produzem auroras polares (quadros bizarros de luzes que tingem o céu em elevadas latitudes) até derrubar linhas de transmissão de energia e interromper transmissões de dados de satélites.
As explosões solares podem até derrubar objetos em órbita da Terra, como aconteceu com o Solarmax, ironicamente um observatório destinado a observar as explosões do Sol.
Neste momento estamos reiniciando um ciclo de explosões (com ligeiro atraso) e o que deve acontecer num período de 5,5 anos é uma seqüência de poderosas explosões com manchas escuras aparecendo na superfície da estrela.
Essas manchas, eventualmente, podem ser observadas a olho nu, no momento do pôr-do-sol, quando a atmosfera mais espessa, para um observador que contempla esse fenômeno, faz com que apenas os comprimentos de onda vermelhos, menos energéticos, atravessem a atmosfera da Terra.
Isso faz com que o Sol não só possa ser observado a olho nu, como faz dele uma majestosa esfera rubra, como uma gigantesca moeda em fusão.
Disso tudo, apenas dois cuidados para eventuais observadores.
Proteja-se sempre sob o Sol, na praia ou em trabalhos do campo, entre outros.
E jamais observe o Sol com um equipamento óptico (binóculo ou telescópio). Isso pode queimar sua retina e produzir cegueira.
Um risco de nunca mais voltar a observar o céu.
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